terça-feira, 19 de novembro de 2013

A Liberdade dos Escravos no Ceará

A Liberdade dos Escravos no Ceará
Em janeiro de 1881, ouviu-se em Fortaleza o grito: “No porto do Ceará não se embarcam mais escravos!” Vinha de um grupo de jangadeiros liderados por Francisco José do Nascimento, o Chico da Matilde. Com o apoio da população e até mesmo de militares, eles decidiram não mais fazer o transporte de negros até o porto - a profundidade da região não permitia que os navios atracassem. O governo manda tropas, mas não consegue obrigar os jangadeiros a retomar a travessia. Chico é demitido do posto de prático na Capitania dos Portos.

A ação dos trabalhadores não foi isolada. Em 1º de janeiro de 1883, o movimento emancipador articulado pela Sociedade Cearense Libertadora consegue a alforria de todos os escravos da vila de Aracape (hoje Redenção). José do Patrocínio comparece à solenidade. Em maio, Fortaleza adere ao movimento. Em setembro é a vez de Mossoró, no Rio Grande do Norte.

25 de março de 1884

O presidente da província do Ceará declara a abolição da escravatura em todo o seu território. O Estado entra para a história por ter sido o primeiro a acabar, ao menos oficialmente, com o trabalho escravo no País.

A participação de Chico da Matilde é relembrada nas celebrações do acontecimento. Apelidado de Dragão do Mar, ele e sua jangada Liberdade são levados para o Rio de Janeiro. Desfila pelas ruas, é aclamado pela multidão. A embarcação entra no acervo do Museu Nacional, mas desaparece tempos depois.

Com o movimento cearense, o governo imperial se vê pressionado. Em 1885 decreta a Lei do Sexagenário, que alforriava os escravos com mais de 60 anos. Três anos depois, em 13 de maio de 1888, vem a Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel. Nas palavras de Joaquim Nabuco, “a emancipação do Ceará foi o acontecimento decisivo para a causa abolicionista”.
A conquista da liberdade
No ano de 1850 o tráfico de negro para o Brasil chegou ao fim. Desta forma, tem início um processo de crise no sistema escravista devido ao aumento de preços dos escravos. Para suprir as necessidades de trabalho não remunerado nos latifúndios, os senhores optam por comprar escravos da região norte do País. Neste cenário, começam a surgir alguns movimentos a favor da abolição, que foram impulsionados pelo fim da Guerra de Secessão nos Estados Unidos, que tinha a abolição da escravatura como um dos motivos.
Como resultados de pressões de alguns setores da sociedade, em 1871 o Brasil aprova a Lei do Ventre Livre. A medida indicava que qualquer filho de escravo nascido após sua aprovação seria um cidadão livre. Porém, a mesma lei indicava que os senhores que criassem as crianças até os oito anos teriam o direito de contar com seu trabalho até os 21 anos de idade como forma de indenização. Apesar da ambiguidade da lei, com ela foi decretado que não nasceriam mais escravos no País.

Movimentos contra a escravidão
Os movimentos contra a escravidão continuam a crescer e já no final do século XIX, no Brasil, a abolição torna-se uma das questões sociais mais discutidas. Grupos organizados antiescravismo se organizam, contando com o apoio de jornalistas, líderes políticos, advogados e clubes. Entre os principais nomes de negros intelectuais envolvidos nesta luta estão: José do Patrocínio, orador, escritor, jornalista e político, André Rebouças, inventor e engenheiro, Luís Gama, jornalista, advogado e escritor e, finalizando, Francisco de Paula Brito, poeta, dramaturgo e escritor.
Para a libertação dos escravos, além da pressão interna e externa, a mão de obra mais qualificada, barata e abundante, proporcionada pela vinda da Europa, de levas de imigrantes que passaram a ocupar lugar de destaque nas lavouras e nos canaviais nordestinos, onde os escravos trabalhavam duro sob a lei do chicote e sem receber salários que só eram pagos aos novos trabalhadores europeus mais afeitos ao trabalho, diga-se a bem da verdade, não que isto justifique o barbárie da escravidão e até mesmo o racismo.


Leis
A Lei do Eusébio de Queiroz
Essa medida era mais uma das ações pelas quais os ingleses pressionavam o Brasil para que a escravidão chegasse ao fim no país. Mais do que questões de ordem humanitária, essa medida tinha por objetivo ampliar o mercado consumidor brasileiro ao converter, progressivamente, a grande maioria dos trabalhadores escravos em futuros consumidores das mercadorias britânicas.
O primeiro resultado de tal pressão acabou surgindo em 1850, quando a Lei Eusébio de Queiroz proibiu a chegada de embarcações negreiras no país. Em sentido prático, essa medida acabou sendo vista como a primeira lei abolicionista oficializada em território brasileiro. Com o passar do tempo, a diminuição da oferta de escravos acabou forçando vários senhores de terra a buscarem o uso da mão de obra assalariada de trabalhadores migrantes.
Apesar dessa primeira conquista o tráfico interno de escravos ainda fez com que muitas das lavouras do país fossem sustentadas pela força de trabalho do escravo. Contudo, o preço de um escravo se tornava cada vez mais elevado, inviabilizando economicamente a sustentação de tal prática. Com isso, a aprovação de outras leis abolicionistas ficaria facilitada na medida em que a própria elite econômica nacional passasse a não mais depender exclusivamente da exploração dos escravos.
A Lei do Ventre Livre
No ano de 1871, a Lei do Ventre Livre estipulou que todos os filhos de escravos que nascessem após o ano de publicação daquela lei fossem considerados libertos. A partir daquele momento, integrantes das classes médias urbanas passaram a se organizar em favor do fim definitivo da escravidão. Em 1880, a criação da Sociedade Brasileira contra a Escravidão estipulou um novo passo. Logo em seguida, a Confederação Abolicionista apareceu como outro movimento a favor da mesma causa.
Ao longo desse período, as discussões sobre o abolicionismo ganharam maior intensidade. Alguns militantes – além de mostrarem a escravidão como um ato irracional e desumano – também argumentavam que a hegemonia do trabalho assalariado seria indispensável para que a economia do país se modernizasse. Outros abolicionistas mais exaltados defendiam a organização de fugas e rebeliões de escravos.
Muitos proprietários de terra e outras figuras envolvidas com a questão temiam que a escravidão fosse extinta de modo imediato no país. Segundo estes, a tomada de uma medida definitiva poderia abrir caminho para a ocorrência de rebeliões que poderiam desestabilizar gravemente a economia da época. Deste modo, vemos que a lentidão do governo imperial acabou legitimando uma abolição de tom gradual.
A Lei dos Sexagenários
1885, a Lei dos Sexagenários determinou que os escravos maiores de sessenta anos fossem Em imediatamente libertados. Na época, a lei foi intensamente criticada, pois existiam poucos negros em idade avançada. Subordinados a condições de trabalho assoladoras, poucos escravos chegavam a viver tanto tempo. Além disso, a liberdade desses escravos representava um ganho para os proprietários, que não lucravam com a exploração da força de trabalho de um escravo idoso.
Foi promulgada no dia 28 de setembro de 1885, não tinha muito efeito prático, pois os escravos com tamanha idade não eram tão valorizados. Era muito difícil também que os escravos conseguissem viver sob as condições impostas até alcançar tal idade. Assim como a Lei do Ventre-Livre, a Lei dos Sexagenários concedeu liberdade a mais uma parcela dos escravos, mas a aplicação prática de ambas era pouco relevante, mantendo o país marcado por sua base escravista
A Lei   Aurea
Somente no ano de 1888, quando a princesa Isabel assumiu o trono na condição de regente, os abolicionistas conseguiram aprovar o decreto que dava fim à escravidão no Brasil. Apesar de conceder a liberdade para milhares, a chamada “Lei Áurea” não tratou de pensar ou garantir a inserção dos negros libertos na sociedade brasileira. Deste modo, a abolição não trouxe transformações significativas na vida dessa parcela da população. No Brasil, a Lei Áurea, é o símbolo máximo da libertação dos escravos, e ela veio, fruto de uma pressão interna muito forte. No Brasil, muitos abolicionistas tinham grande representatividade na sociedade colonial e o próprio exército imperial vacilava ao fazer o papel de capitão do mato, ao executarem as ordens dos Senhores de Engenhos, que eram os grandes escravistas, os donos de engenhos e os donos das grandes fazendas, onde se plantava a cana para a fabricação do açúcar, grande riqueza do Período Colonial.

A VIDA DOS NEGROS BRASILEIROS APOIS A ABOLIÇAO
Após a abolição, a vida dos negros brasileiros continuou muito difícil. O estado brasileiro não se preocupou em oferecer condições para que os ex-escravos pudessem ser integrados no mercado de trabalho formal e assalariados. Muitos setores da elite brasileira continuaram com o preconceito. Prova disso, foi a preferência pela mão-de-obra europeia, que aumentou muito no Brasil após a abolição. Portanto, a maioria dos  negros encontrou grandes dificuldades para conseguir empregos e manter uma vida com o mínimo de condições necessárias (moradia e educação principalmente).

A CARTA DE ALFORRIA


A Carta de Alforria  era um documento cedido a um escravo por seu proprietário. Era um tipo de “atestado” de liberdade em que o proprietário abdicava dos seus direitos de posse sobre o escravo. Este último, após a Alforria, era chamado “negro forro”.
O nome “Alforria” não era usado somente no Brasil, mas em todas as colônias portuguesas que adotaram o regime escravista. Ele vem do árabe, em que a expressão pronunciada como “Al Horria” quer dizer “A Liberdade”.
Existiram dois tipos de Carta de Alforria: as pagas e as gratuitas.
As cartas pagas geralmente eram feitas a prestação, por interesse dos proprietários. Assim, se o negro forro não pagasse uma prestação, voltava a condição de escravo. Outros meios utilizados para quitar a dívida eram pegar empréstimos (com amigos, familiares, instituições benfeitoras ou bancos), trabalhar por conta própria (geralmente vendendo na rua produtos que variavam entre bolos e doces, ou prestando serviços de barbeiro, carregador de peso, sapateiro, etc), pedir a um benfeitor que pagasse sua dívida em troca de um tempo determinado de trabalhos gratuitos ou os estranhos casos de troca, em que o escravo que recebia a alforria dava ao seu senhor um outro escravo para trabalhar em seu lugar.
As cartas gratuitas libertavam adultos e geralmente os reposicionavam como empregados do seu não mais proprietário. Deste modo, libertava-se um escravo e ganhava-se um trabalhador assalariado com uma carga horária diária pré definida. Também era comum a libertação de crianças e a promessa de educá-las e criá-las por partes dos senhores. O momento histórico que registra a emissão de cartas de alforria gratuitas é importante porque mostra uma mudança de mentalidade na “alta sociedade” da época.

A CONTRIBUIÇÃO DO NEGRO NA FORMAÇÃO DO BRASIL


A CONTRIBUIÇÃO DO NEGRO NA FORMAÇÃO DO BRASIL

Capturados em sua terra natal pelos Portugueses e por chefes locais que os negociavam com os traficantes em troca de produtos manufaturados esta situação deu-se do século XVI até o século XIX. Chegavam ao Brasil amontoados em porões de navios negreiros chamados de Tumbeiros. Muitos morriam durante a longa viagem pela insalubridade, pouca alimentação e superlotação. Os que chegavam eram vendidos na colônia, com Salvador, Recife e Rio de Janeiro, de lá eram distribuídos para o trabalho nas lavouras de cana de açúcar. O africano nunca aceitou sua condição de escravo, sempre que podia se rebelava com tentativas de assassinato de feitores e senhores de engenho, fugas e suicídios. Os que conseguiam fugir dos capitães do mato, organizaram em quilombos, verdadeiras comunidades negras livres. O principal e mais famoso é o de Palmares, localizado no atual estado de Alagoas, e seu mais famoso líder foi Zumbi que lutou dinheiro adsense até sua morte no dia 20 de novembro de 1695, contra a escravidão. Essa data foi consagrada no Brasil como dia da Consciência Negra. Além dos fortes braços que carregaram a economia do Brasil no passado, eles nos influenciaram em nossa cultura como o samba, a capoeira, o candomblé e a alimentação. Miscigenaram de uma tal forma que o Brasil, gerou uma Identidade Nacional singular. Contudo nos dias de hoje, mesmo depois da abolição, o país está longe de ser uma nação onde todos sejam iguais. O espaço e a visibilidade que o negro tem em nossa sociedade, não permitem que ele sirva de referência. Ainda os brancos recebem salários superiores aos recebidos por negros na mesma função, o nível de desemprego deste também é maior. No campo do alfabetismo, a repetência e a evasão escolar são mais acentuadas para os negros. O preconceito só é combatido com educação, que começa com a família e uma convivência de forma comunitária.
Danças
Coco: também denominado “bambelô”, é muito dançando da região praiana do Nordeste, sobretudo Alagoas. É uma dança de roda, cuja coreografia é mais um sapateado, acompanhado de plantas.














Frevo: teve origem na capoeira, cujos movimentos foram estilizados para evitar a repressão policial. O nome vem da ideia de fervura (pronunciada incorretamente como “frevura”). É uma dança coletiva, executada com uma sombrinha, que seve para manter o equilíbrio e embelezar a coreografia. Atualmente, é símbolo do carnaval pernambucano.





Moçambique: frequentemente executado em São Paulo, Minas Gerais, e no Brasil Central. Os participantes formam uma esteira de losangos com bastões, pulam, agacham, e sacodem, sem tocar nos bastões. Enquanto dançam e louvam aos santos, em solo e coro. Considerado por alguns folcloristas uma dança, por outros um folguedos (ou festa popular).














Maracatu: é propriamente um desfile carnavalesco, remanescente das cerimônias de coroação dos reis africanos. A tradição teve início pela necessidade dos chefes tribais, vindos do Congo e de Angola, de expor sua força e seu poder, mesmo com a escravidão. Atualmente faz parte do carnaval de Pernambuco.

 











Capoeira: trazida pelos negros de Angola, inicialmente, não era praticada como luta, mas como dança religiosa. Mas, no século XVI, para resistir às expedições que pretendiam exterminar Palmares, os escravos foragidos aplicavam os movimentos da capoeira como recurso de ataque e defesa. Em 1928, um livro estabeleceu as regras para o jogo desportivo de capoeira e ilustrou seus principais golpes e contragolpes. O capoeirista era considerado um marginal, um delinquente. O Decreto-lei 487 acabou temporariamente com a capoeira, mas os negros resistiram até a sua legalização. E em 15 de julho de 2008 a capoeira foi reconhecida como Patrimônio Cultural Brasileiro e registrada como Bem Cultural de Natureza Imaterial.


                     

      









Literatura
A literatura popular de origem africana é riquíssima. Ela contém uma vasta série de contos e lendas, que hoje integram o folclore brasileiro: contos totêmicos, ou seja, conjuntos de animais, como: tartaruga, lebre, sapo, antílope, elefante, crocodilo etc.
Contos de assombrações e entidades sobrenaturais, como a lenda do quibungo, que significa lobo. É uma espécie de entidade sobrenatural, meio homem, meio animal, que possui um enorme buraco no meio das costas, na qual atira meninos que persegue para comer.
A cultura material de origem africana também é vastíssima, abarcando artesanatos e técnicas, tais como: a fabricação de instrumentos musicais, a culinária, a fabricação de utensílios de cozinha e a indumentária, entre outros. Entre os instrumentos trazidos pelos africanos para o Brasil se destacam os de percussão, segundo o dicionário da língua portuguesa Aurélio (1998):
Musicas
A música negra ou Black Music (também conhecida como música afro-brasileira no Brasil e música afro-americana nos Estados Unidos) é um termo dado a todo um grupo de gêneros musicais que emergiram ou foram influenciados pela cultura de descendentes africanos em países colonizados por um sistema agrícola baseado na utilização de mão-de-obra escrava (plantation). É comum em toda a América, onde o uso de mão-de-obra escrava negra foi amplamente utilizada. As músicas tribais africanas foram trazidas pelos escravos para os países americanos, onde se mesclaram com outros ritmos europeus, formando novos gêneros musicais.


Esportes

Os negros foram uma ótima influência para o esporte...
Dentro do esporte eles inventaram a CAPOEIRA! Isso foi uma ótima influência por muitos motivos...Como um deles que quando os escravos treinavam os donos achavam que estavam apenas dançando.
Uma grande influência para o esporte negro é o Usain Bolt conhecido como "O Homem mais rápido do mundo”. Ele conquistou o tri mundial nos 200m livre.


Culinária
A feijoada brasileira, considerada o prato nacional do Brasil, é frequentemente citada como tendo sido criada nas senzalas e ter servido de alimento para os escravos na época colonial. Atualmente, porém, considera-se a feijoada brasileira uma adaptação tropical da feijoada portuguesa que não foi servida normalmente aos escravos. Apesar disso, a cozinha brasileira regional foi muito influenciada pela cozinha africana, mesclada com elementos culinários europeus e indígenas.
A culinária baiana é a que mais demonstra a influência africana nos seus pratos típicos como acarajé, caruru, vatapá e moqueca. Estes pratos são preparados com o azeite-de-dendê, extraído de uma palmeira africana trazida ao Brasil em tempos coloniais. Na Bahia existem duas maneiras de se preparar estes pratos "afros". Numa, mais simples, as comidas não levam muito tempero e são feitos nos terreiros de candomblé para serem oferecidas aos orixás. Na outra maneira, empregada fora dos terreiros, as comidas são preparadas com muito tempero e são mais saborosas, sendo vendidas pelas baianas do acarajé e degustadas em restaurantes e residências.

 Medicina
As plantas na medicina popular e nos rituais afro-brasileiros
As plantas medicinais e a medicina popular
A medicina popular poderá ser entendida como um corpo de conhecimentos e práticas médicas, que se desenvolve numa dinâmica própria, com base no conhecimento empírico, segundo o contexto sociocultural e econômico em que se insere. Trata-se de uma medicina sincrética, que envolve componentes herdados da medicina dos antepassados que vão sendo reinterpretados e adequados às realidades do presente, somados a elementos resultantes de diferentes influências. Desta forma, a medicina popular vai sofrendo mudanças, cujos fatores determinantes devem-se, principalmente, às influências dos meios de comunicação de massa, e da coexistência e interinfluência, na mesma sociedade, do sistema médico oficial e do sistema médico popular, favorecendo, também, a urbanização da medicina rural. (Camargo, 1985:11) Podemos observar no Brasil, a aproximação da medicina popular com os mais diferentes sistemas de crenças. Entre as formas adotadas para a realização das curas, estão os procedimentos de caráter religioso, a fim de reforçarem as terapias adotadas. Nesses casos, são comuns os passes, orações, além dos bentinhos, medalhas, patuás, crucifixos, escapulários colocados junto aos doentes, para citar alguns exemplos.
No interior do Estado de São Paulo, na zona rural da região de Ibiúna, área pesquisada, predominam curadores munidos quase sempre de ramos verdes, como de arruda (Ruta graveolens), alecrim (Rosmarinus officinalis), que benzem e rezam, práticas essas ligadas a um catolicismo que se popularizou através das crenças nas forças protetoras de santos católicos. Mas, o pentecostalismo voltado às curas divinas, vai se expandindo para além das áreas urbanas atingindo os redutos dos rezadores, onde surgem, também, centros de umbanda, conhecidos em Ibiúna por “sarava”.
Essa religiosidade presente na medicina popular, deve-se em parte à herança portuguesa dos primórdios do Brasil, que trouxe a crença nas curas milagrosas através da intercessão de santos católicos junto aos poderes de Deus.
A colonização portuguesa nos primeiros séculos, ou seja, XVI e XVII, deixou profundas marcas nas práticas médicas populares do Brasil de hoje. A medicina era exercida pelos físicos, cirurgiões e barbeiros, como eram denominados aqueles que sabiam curar e sangrar. Exerciam, também essa tarefa os padres da Companhia de Jesus, pois tinham noções de primeiros socorros médicos e conheciam botânica, embora tivessem vindo com a incumbência precípua de desempenhar o trabalho de catequese junto aos indígenas. Esses profissionais praticavam uma medicina impregnada de espírito de religiosidade marcada pela fé cristã, tal como era em Portugal, onde a medicina era ensinada nos conventos e onde, também, os livros médicos eram escritos.
Muitos daqueles médicos vieram voluntariamente para o Brasil devido à sua ascendência judaica e chegaram como cristãos-novos, pois era comum aderirem à vida religiosa dos mosteiros, a fim de se protegerem da Inquisição. Porém, esses médicos tinham ideias religiosas que contrariavam o pensamento da igreja católica. Enquanto está admitia que a doença era castigo divino e que o homem não podia intervir nos desígnios de Deus sem autorização prévia dos clérigos, os médicos judeus julgavam que a arte de curar era dom divino, sendo pois, dever religioso curar os doentes. (Herson 1996:47)
Os jesuítas em seus trabalhos de catequese faziam os indígenas entenderem que o batismo era fundamental para se alcançar a salvação eterna e assim, forçava-os a se batizarem primeiro antes de curá-los. Aquele que recusava o batismo poderia ser fatalmente castigado com a morte. (Leite 1954 v.2:159-61)
Esse era o panorama médico nos primeiros tempos de colonização no Brasil.
A medicina popular de hoje continua a se apoiar fortemente na fé religiosa que reforça o sentimento de culpa e do castigo divino, quando diante de problemas de saúde. As terapias adotadas são sempre acompanhadas de orações, penitências, promessas visando o merecimento da graça da cura.
As terapias daquele período histórico do Brasil, eram praticamente as mesmas adotadas em Portugal, onde as plantas desempenhavam importante papel na preparação dos remédios. Os jesuítas as conheciam muito bem, visto que mantinham boticas onde atendiam aos doentes e forneciam-lhes as plantas, quase todas vindas de Portugal. Dentre essas plantas estavam: manjericão, salsa, arruda, bredo, hortelã, coentro, berinjela, alho, ervilha, lentilha, pepino, melão. (França 1929) Com as dificuldades que tinham para receber tais plantas, visto que as viagens levavam muito tempo, eles passaram a substituí-las por plantas indígenas, visto que de seu contato com os nativos, o qual já vinha se processando, muito foi sendo aprendido e, assim, muitas plantas nativas foram incorporadas à coleção mantida nas boticas. Dentre aquelas plantas nativas de valor medicinal estavam também as plantas litúrgicas, usadas nas cerimônias da igreja. Citam-se os exemplos da umburana (Bursera leptophloeos) e da Cabreúva (Myroxilon toluifera), que o padre José de Anchieta, achando-as parecidas, no aroma desprendido quando cremadas, com as espécies asiáticas usadas pela igreja, consagrou-as aos cultos, consertando-lhes os nomes de mirra e incenso respectivamente. A essas plantas somavam-se aquelas originárias da Europa, já citadas acima, que foram introduzidas, visto que Portugal tinha interesse em cultivá-las nas colônias, principalmente no Brasil. Muitas delas se desenvolveram com tal facilidade que hoje podemos vê-las espalhadas por todo o País. (Camargo, 1997)
As “patologias” hoje encontradas no meio popular lembram aquelas comuns nos tempos coloniais e, ainda, hoje recebem o mesmo tratamento ou formas estratégicas de desativar o agente causador da doença. Existem doenças tais como a doença de macaco como é conhecida no meio popular, da qual são acometidas, principalmente, as crianças. Trata-se de avitaminose e falta de outros elementos necessários para seu desenvolvimento, caracterizada como síndrome policarencial. Cita-se, ainda, o mal-de-7-dias ou mal-de-umbigo, o mesmo que tétano no cordão umbilical de recém-nascidos. Outra doença que aparece com alguma frequência é a espinhela caída. Trata-se de dor na região epigástrica decorrente de uma deformação do apêndice xifoide, provocando dores de estômago, vômitos, além de problemas respiratórios. Hoje, essa “patologia” ainda é frequente no meio popular, onde é curada com rezas e benzi mentos.